Introdução :
O QUE É LETRAMENTO? Processo de aprendizado do uso da tecnologia da língua escrita. Isto é,
a criança pode utilizar recursos da língua escrita em momentos de fala, mesmo
antes de ser alfabetizada. Esse aprendizado se dá a partir da convivência dos
indivíduos (crianças/adultos, crianças/crianças), com materiais escritos
disponíveis - livros, revistas, cartazes, rótulos de embalagens, entre outros
-, e com as práticas de leitura e de escrita da sociedade em que se inscrevem.
Esse processo acontece pela mediação de uma pessoa mais experiente através dos
bens materiais e simbólicos criados em sociedade. • NÍVEL DE LETRAMENTO Este, é determinado pela variedade de gêneros
de textos escritos que a criança ou adulto reconhece. A criança que vive em um
ambiente em que se leem livros, jornais, revistas, bulas de remédios, enfim, e
qualquer outro tipo de literatura (ou, em que se conversa sobre o que se leu,
ou mesmo, em que uns leem para os outros em voz alta, leem para a criança
enriquecendo com gestos e ilustrações), o nível de letramento será superior ao
de uma criança cujos pais não são alfabetizados e não teve o privilégio de
conviver com pessoas que pudessem favorecer este contato com o mundo letrado. •
ALFABETIZAÇÃO O processo de
descoberta do código escrito pela criança letrada.
É mediado pelas significações que os
diversos tipos de discursos têm para ela, ampliando seu campo de leitura
através da alfabetização. Antigamente, acreditava-se que a criança era iniciada
no mundo da leitura somente ao ser alfabetizada, pensamento este ultrapassado
pela concepção de letramento, que leva em conta toda a experiência que a
criança tem com leitura, antes mesmo de ser capaz de ler os signos escritos.
Atualmente, não se considera mais como alfabetizado quem apenas consegue ler e
escrever seu nome, mas quem sabe escrever um bilhete simples. Portanto,
letramento decorre das práticas sociais que leituras e escritas exigem nos
diferentes contextos que envolvem a compreensão e expressão lógica e verbal. É
a função social da escrita. Enquanto que a alfabetização se refere ao
desenvolvimento de habilidades da leitura e escrita.
Sons e Letras Aquisição do valor
sonoro convencional Adquirir os valores sonoros convencionais é perceber a
correspondência entre grafema e fonema, isto é, apropriar-se do conhecimento de
que existe uma relação entre o som /A/ e a letra A, o som /B/ e a letra B, e
assim por diante, com todas as letras, que naturalmente estão inseridas em
palavras, frases e textos. Um dos pontos fundamentais em relação à aquisição
dos valores sonoros convencionais é a ordem de complexidade. Ela é crescente,
não-linear, é parcial e com diversos ramos. Isso quer dizer que a aquisição
pode ocorrer em diferentes ordens e até simultaneamente, e não há possibilidade
de se controlar esse processo. O fato de se organizar um processo apresentando
as letras numa determinada ordem não garante a aprendizagem nessa ordem. O
professor pode ficar desenvolvendo durante um mês a “família” ba-be-bi-bo-bu e
as crianças podem estar adquirindo várias letras, inclusive o B com outras
letras, exceto o B propriamente. A compreensão desse fato leva a uma mudança em
relação à prática pedagógica. Se o professor sabe que a organização e a
sequenciação do processo não levam à aprendizagem nessa .
Ordem, por que
organizar e levar seis meses ou mais para regular a apresentação de todas as
letras para as crianças? Mais real é apresentar o alfabeto (campo de trabalho)
e permitir que as crianças adquiram na sua ordem natural e em muito menos
tempo! Quando se desenvolve essa prática, há a “liberação” da criança para
reconstruir o sistema linguístico no seu tempo e, na maioria das vezes, esse
tempo é pequeno em comparação com o método tradicional organizado. Interessante
ainda ressaltar é o fato de que, apesar do método tradicional organizado pelo
professor, grande parte dos alunos reorganiza e reconstroi o sistema
linguístico, mas não se manifesta até ser liberados por seu professor. Um
exemplo disso é um garoto que, diante de um pote de geléia, leu “Cica”. Em
seguida, disse: “Só que eu não posso ler, porque minha professora disse que o
“ci” eu ainda não aprendi”. Realizando uma sondagem As investigações sobre a
psicogênese da língua escrita permitem ao professor atuar como mediador no
processo ensino-aprendizagem e fornecer pistas para o aprendiz tornar-se
alfabético.
Atividade essencial, nesse processo, é a sondagem diagnóstica, que
capacita o educador a conhecer as hipóteses das crianças envolvidas no processo
de alfabetização (pré-silábico, intermediário I, silábico, silábico-alfabético
e alfabético). Para realizar a sondagem escolhem-se quatro palavras (uma
polissílaba, uma trissílaba, uma dissílaba e uma monossílaba, nessa ordem) e
uma frase de um mesmo campo semântico (mesmo assunto). Por exemplo: dinossauro,
jacaré, gato e boi. O gato dormiu na sala. Pede-se, então, para que as crianças
escrevam do jeito que souberem. O professor pode pedir às crianças que ao lado
da palavra façam o desenho, que servirá como índice para a leitura. Quando o
professor encontra dificuldade para realizar a leitura da escrita da criança, é
importante pedir para que ela leia, apontando as letras e sinais
correspondentes à fala. Outro elemento importante que pode servir como sondagem
é a escrita de textos espontâneos (escrever uma história, como souber). Nesse
caso, a análise da escrita pode ser feita a partir dos seguintes parâmetros:
não-alfabético, nível intermediário II e alfabético).
A partir do material
investigado em uma sondagem, pode-se refletir sobre o pensamento da criança e
perceber sua hipótese linguística. Isso permite a formação de grupos de
trabalho heterogêneos e propostas de atividades diversificadas, que objetivem a
desestruturação da hipótese que a criança tem a respeito da linguagem escrita,
bem como a construção de uma nova hipótese, culminando na reconstrução do
código linguístico. Uma das formas de contribuir para esse trabalho é utilizar
jogos. Jogando se aprende a fazer de conta, representar uma coisa por outra,
criar códigos, perceber as letras. Apreende-se o valor sonoro convencional e
reconstrói o código linguístico. Para que se lê? • Para sentir o texto,
dialogar com seu autor ou, simplesmente, para usufruí-lo: sem perguntas, sem
questionamentos. É a leitura-prazer. • Para buscar informações, coletar dados.
É a leitura-pesquisa. • Para ampliação dos conhecimentos – apossar-se do que já
foi construído pela humanidade. • Para esclarecer dúvidas, buscar respostas.
Pergunta-se ao texto. A leitura e a
escrita de textos funcionais, científicos e literários, a partir do
conhecimento e do domínio das propriedades específicas de cada um; a busca de
coerência, interna e externa, de coesão, de harmonia, de movimento e de
estabelecimento de paralelos e de ligações, entre o real e o imaginário,
possível ou não, em suas produções escritas, são alguns pontos a ser
construídos.
Viver em sociedade exige conhecer e utilizar-se de diferentes
materiais impressos que circulam ou que atropelam, visualmente, as pessoas:
outdoor, propagandas, cartazes, panfletos, jornais, revistas, receituário
médico, placas, anúncios, bilhetes, catálogo telefônico, circulares, ofícios,
requerimentos, cheques e muitos outros. Permitir a exploração destes materiais
(leitura e produção) significa partir da realidade dos educandos, isto é, do
que é cotidiano; significa, ainda, propiciar-lhes a oportunidade de ampliar e
aprimorar a sua competência linguística, de se adaptar à sociedade. As
crianças, que vivem num ambiente estimulador, constantemente estão recebendo
informações sobre a função social da escrita. • ampliar a memória; recordar
aspectos e coisas que possam ser esquecidos (lista de compras, agenda). •
encontrar informações urgentes (endereços, telefones...); • comunicar-se à
distância (bilhete, recado, carta...). O texto técnico-informativo exige
escritor e leitor interessados em determinado tema. Permite o crescimento do
indivíduo enquanto ser social e de cultura. Os textos científicos/ informativos
possibilitam novas formas de pensamento; trazem novos conhecimentos, permitem
avanços científicos e a busca de soluções alternativas. São textos relacionados
com o conhecimento sistematizado já produzido pelo homem nos diferentes campos
da ciência. Permite acrescentar coisas ao que se sabe.
O terceiro tipo de texto
inclui um outro aspecto do letramento, que é o prazeroso, o belo, o estético da
língua – a literatura. Envolver-se
com literatura é permitir-se conhecer outros padrões linguísticos, enxergar o
mundo através de outros olhos e de pensamentos, os mais diversos. É apresentar
estilos, o como se utilizar da língua escrita, de forma viva, com muito
movimento e harmonia. Permite viagens no tempo – passado e futuro –
envolvimento em idéias e acontecimentos de nossa própria escolha. Buscam-se, em
um texto, informações, reflexões, pretextos e prazer.
Alfabetizando Quem se responsabiliza
pelas crianças que estão na escola e não estão aprendendo? Vivemos um momento
importante na educação brasileira, porque de mudança, e não sem tempo. Hoje, os
esforços de todos os bem-intencionados organizam-se da maneira que podem para
combater uma cultura que no último meio século dizimou milhões de crianças
brasileiras: a cultura da repetência. Mas enfrentamos, como em todos os grandes
movimentos de mudança, armadilhas que, se não forem percebidas, atrasarão o
avanço que estamos tentando fazer em direção a uma educação eficiente e de boa
qualidade para todos. Uma dessas armadilhas consiste em acreditar que,
engajados na nova e boa palavra de ordem – “o aluno não deve ser reprovado”, os
professores passarão a aprová-lo, enviando-o para a série seguinte munido de
todas as competências necessárias para cursá-la com sucesso. Como se até então
não o fizessem simplesmente por descaso com seu próprio trabalho, ou por
acreditarem que professor bom é o que reprova. Essa situação costuma ser mais
dramática no contexto das primeiras séries do Ensino Fundamental, que é quando
são tomadas decisões de importância vital: se o aluno aprende a ler e a
escrever nos dois primeiros anos e será promovido, ou se ficará retido ali, ano
após ano, até desistir da escola; se, mesmo sem aprender, será promovido e
engrossará o número dos que, cada vez mais, chegam analfabetos à 4ª série; se,
mesmo precariamente alfabetizados e sem nenhuma competência para compreender
textos mais complexos, classes inteiras de 4ª série.
Iniciarão o segmento da 5ª
à 8ª séries para fracassar diante da necessidade de aprender por meio da
leitura. Vemos, hoje, a enorme dificuldade que os professores têm de verificar
o que os alunos já sabem e o que não sabem.
Há alunos que produzem escritas
silábico-alfabéticas e alfabéticas na 1ª série, no início do ano, e que
poderiam perfeitamente acompanhar uma 2ª série, pois podem ler e escrever,
ainda que com precariedade, mas ficam retidos porque os professores não tiveram
condições de avaliá-los adequadamente e acabaram utilizando indicadores como
“letra bonita” ou “caderno bem-feito”. Quando o professor trabalha com esse
tipo de indicador, até mesmo avanços na aprendizagem acabam prejudicando o
aluno. Por exemplo, quando o aluno aprende a ler, é comum que ele comece a
“errar” na cópia. Isto é, deixa de copiar letra por letra e começa a ler e a
escrever grandes blocos de palavras, em geral unidades de sentido, o que faz
com que cometa erros de ortografia ou escreva palavras grudadas.
Tal fato, que
é na verdade indicador de progresso, acaba sendo interpretado como regressão,
pois o professor não tem clara a diferença entre copiar e escrever. Na nossa
cultura, a produção de multi-repetentes em massa decorre da visão de que o
aluno é sempre responsável por sua aprendizagem. Essa maneira de olhar para a
questão do fracasso escolar, embora não produza diretamente a repetência
maciça, é certamente responsável pela aceitação institucional do fenômeno, por
sua naturalização.
Tanto que, quando se trata de crianças de apenas sete anos,
consideradas jovens demais para tanta responsabilidade, a suposta falta de
empenho é transferida para a família. A despeito de todas as boas intenções, o
atual esforço de transformação da educação brasileira será sugado pelo buraco
negro da nossa incapacidade de alfabetizar os alunos no início da escolaridade
obrigatória (na verdade, o processo de alfabetização começa bem antes e deveria
estar presente na Educação Infantil, como costuma acontecer com os filhos da
elite).
Prova disso é que, para desespero dos que sabem para onde isso sempre
nos tem levado, estamos assistindo à transformação da generosa ideia de
progressão continuada nessa perversão que está tornando-se conhecida como
“promoção automática”. Atualmente, com a progressão continuada, as classes
continuam divididas entre “os que vão” e “os que não vão”, mas com uma pequena
diferença: antes eram os que “vão aprender e passar de ano e os que não vão
aprender nem passar de ano” e agora todos “passam de ano”, porém só alguns “vão”
aprender.
Receita de alfabetização Pegue uma criança de 6 anos e lavea bem.
Enxágüe-a com cuidado, enrole-a num uniforme e coloque-a sentadinha na sala de
aula. Nas oito primeiras semanas, alimente-a com exercícios de prontidão. Na 9ª
semana ponha uma cartilha nas mãos da criança. Tome cuidado para que ela não se
contamine no contato com livros, jornais, revistas e outros perigosos materiais
impressos. Abra a boca da criança e faça com que engula as vogais. Quando tiver
digerido as vogais, mande-a mastigar, uma a uma, as palavras da cartilha. Cada
palavra deve ser mastigada, no mínimo, 60 vezes, como na alimentação
macrobiótica.
Se houver dificuldade para engolir, separe as palavras em
pedacinhos. Mantenha a criança em banho-maria durante quatro meses, fazendo
exercícios de cópia. Em seguida, faça com que a criança engula algumas frases
inteiras. Mexa com cuidado para não embolar. Ao fim do oitavo mês, espete a
criança com um palito, ou melhor, aplique uma prova de leitura e verifique se
ela devolve pelo menos 70% das palavras e frases engolidas. Se isso acontecer,
considere a criança alfabetizada. Enrole-a num bonito papel de presente e
despache-a para a série seguinte. Se a criança não devolver o que lhe foi dado
para engolir, recomece a receita desde o início, isto é, volte aos exercícios
de prontidão. Repita a receita tantas vezes forem necessárias.
Ao fim de três
anos, embrulhe a criança em papel pardo e coloque um rótulo: aluno renitente.
Alfabetização sem receita Pegue uma criança de 6 anos ou mais, no estado em que
estiver, suja ou limpa, e coloquea numa sala de aula onde existam muitas coisas
escritas para olhar e examinar. Servem jornais, livros, revistas, embalagens,
propaganda eleitoral, latas vazias, caixas de sabão, sacolas de supermercado,
enfim, vários tipos de materiais que estiverem ao seu alcance.
Converse com a
turma, troque ideias sobre quem são vocês e as coisas de que gostam e não
gostam. Escreva no quadro algumas frases que foram ditas e leia-as em voz alta.
Peça às crianças que olhem os escritos que existem por aí, nas lojas, nos
ônibus, nas ruas, na televisão. Escreva algumas dessas coisas no quadro e
leia-as para a turma. Deixe as crianças cortarem letras, palavras e frases dos
jornais velhos e não esqueça de mandá-las limpar o chão depois, para não criar
problema na escola. Todos os dias leia em voz alta alguma coisa interessante:
historinha, poesia, notícia de jornal, anedota, letra de música, adivinhações.
Mostre alguns tipos de coisas escritas que elas talvez não conheçam: um catálogo
telefônico, um dicionário, um telegrama, uma carta, um bilhete, um livro de
receitas de cozinha.
Desafie as crianças a pensar sobre a escrita e pense você
também. Quando elas estiverem escrevendo, deixe-as perguntar ou pedir ajuda ao
colega. Não se apavore se uma criança estiver comendo letra: até hoje não houve
caso de indigestão alfabética. Acalme a diretora se ela estiver alarmada.
Invente sua própria cartilha. Use sua capacidade de observação para verificar o
que funciona, qual o modo de ensinar que dá certo na sua turma.
Leia e estude
você também. Obs.: Os textos “Receita de Alfabetização” e “Alfabetização sem
receita” têm circulado em cursos para professores, às vezes, sem indicação da
autoria. Foram publicados: no Boletim Informativo n.1, da Secretaria Municipal
de Educação do Rio de Janeiro, jul/1989; pelo Boletim Carpe Diem, Centro de
Aperfeiçoamento dos Profissionais de Educação, Prefeitura de Belo Horizonte,
ano IV, n.4, janfev/1994.
Alfabetização e Letramento No início
da década de 1980, os estudos acerca da psicogênese da língua escrita trouxeram
aos educadores o entendimento de que a alfabetização, longe de ser a
apropriação de um código, envolve um complexo processo de elaboração de
hipóteses a respeito da representação linguística; os anos que seguiram, com a
emergência dos estudos sobre o letramento, foram igualmente férteis na
compreensão da dimensão sociocultural da língua escrita e seu aprendizado.
Em
estreita sintonia, ambos os movimentos, nas suas vertentes teórico-conceituais,
romperam definitivamente com a segregação dicotômica entre o sujeito que
aprende e o professor que ensina. Romperam também com o reducionismo que
delimitava a sala de aula como o único espaço de aprendizagem. Reforçando os
princípios antes propalados por Vygotsky e Piaget, a aprendizagem se processa
em uma relação interativa entre o sujeito e a cultura em que vive. Isso quer
dizer que, ao lado dos processos cognitivos de elaboração absolutamente pessoal
(ninguém aprende pelo outro), há um contexto que não só fornece informações
específicas ao aprendiz, como também motiva, dá sentido e “concretude” ao
aprendizado, e ainda condiciona suas possibilidades efetivas de aplicação e uso
nas situações vividas.
Entre o homem e os saberes próprios de sua cultura, há
que se valorizar os inúmeros agentes mediadores da aprendizagem (não só o
professor, nem só a escola, embora estes sejam agentes privilegiados pela
sistemática pedagogicamente planejada, objetivos e intencionalidade assumida).
A concepção de letramento contribuiu para redimensionar a compreensão que hoje
temos sobre: a) as dimensões do aprender a ler e a escrever; b) o desafio de
ensinar a ler e a escrever; c) o significado do aprender a ler e a escrever; d)
o quadro da sociedade leitora no Brasil; e) as próprias perspectivas das
pesquisas sobre letramento.
As dimensões do aprender a ler e a escrever Durante
muito tempo a alfabetização foi entendida como mera sistematização do B+A = BA,
isto é, como a aquisição de um código fundado na relação entre fonemas e grafemas.
Em uma sociedade constituída em grande parte por analfabetos e marcada por
reduzidas práticas de leitura e escrita, a simples consciência fonológica que
permitia aos sujeitos associar sons e letras para produzir/ interpretar
palavras (ou frases curtas) parecia ser suficiente para diferenciar o
alfabetizado do analfabeto. Com o tempo, a superação do analfabetismo em massa
e a crescente complexidade de nossas sociedades fazem surgir maiores e mais
variadas práticas de uso da língua escrita. Tão fortes são os apelos que o
mundo letrado exerce sobre as pessoas, que já não lhes basta a capacidade de
desenhar letras ou decifrar o código da leitura.
Seguindo a mesma trajetória
dos países desenvolvidos, o final do século XX impôs a praticamente todos os povos
a exigência da língua escrita não mais como meta de conhecimento desejável, mas
como verdadeira condição para a sobrevivência e a conquista da cidadania. Foi
no contexto das grandes transformações culturais, sociais, políticas,
econômicas e tecnológicas que o termo letramento surgiu, ampliando o sentido do
que tradicionalmente se conhecia por “alfabetização”. Hoje, tão importante
quanto conhecer o funcionamento do sistema de escrita é poder se engajar em
práticas sociais letradas, respondendo aos inevitáveis apelos de uma cultura
grafocêntrica.
Mais do que expor a oposição entre os conceitos de
“alfabetização” e “letramento”, Magda Soares (In: Colello, 2004: 10910)
valoriza o impacto qualitativo que este conjunto de práticas sociais representa
para o sujeito, extrapolando a dimensão técnica e instrumental do puro domínio
do sistema de escrita: “alfabetização é o processo pelo qual se adquire o
domínio de um código e das habilidades de utilizá-lo para ler e escrever, ou
seja: o domínio da tecnologia – do conjunto de técnicas – para exercer a arte e
ciência da escrita. Ao exercício efetivo e competente da tecnologia da escrita
denomina-se letramento, que implica habilidades várias, tais como: capacidade
de ler ou escrever para atingir diferentes objetivos.” Por isso, aprender a ler
e a escrever implica não apenas o conhecimento das letras e do modo de
decodificá-las (ou de associá-las), mas a possibilidade de usar esse
conhecimento em benefício de formas de expressão e comunicação, possíveis,
reconhecidas, necessárias e legítimas em um determinado contexto cultural. O
desafio de ensinar a ler e a escrever Na análise da questão em como conciliar
duas vertentes da língua em um único sistema de ensino, destacaremos dois
embates: o conceitual e o ideológico. 1) O embate conceitual Tendo em vista a
independência e a interdependência entre alfabetização e letramento (processos
paralelos, simultâneos ou não, mas que indiscutivelmente se complementam),
alguns autores contestam a distinção de ambos os conceitos, defendendo um único
e indissociável processo de aprendizagem.
Em uma concepção progressista de
“alfabetização”, o processo de alfabetização incorpora a experiência do
letramento e este não passa de uma redundância em função de como o ensino da
língua escrita já é concebido. É preciso conhecer o mérito teórico e conceitual
de ambos os termos. Balizando o movimento pendular das propostas pedagógicas
(não raro transformadas em modismos banais e mal assimiladas), a compreensão
que hoje temos do fenômeno do letramento presta-se tanto para banir
definitivamente as práticas mecânicas de ensino instrumental, como para se
repensar na especificidade da alfabetização. Na ambivalência dessa revolução
conceitual, encontra-se o desafio dos educadores em face do ensino da língua
escrita: o alfabetizar letrado.
O embate ideológico Contagiada pela
concepção de que o uso da escrita só é legítimo se atrelada ao padrão elitista
da “norma culta” e que esta, por sua vez, pressupõe a compreensão de um
inflexível funcionamento linguístico, a escola tradicional sempre pautou o
ensino pela progressão ordenada de conhecimento: aprender a falar a língua
dominante, assimilar as normas do sistema de escrita para, um dia (talvez
nunca), fazer uso desse sistema em formas de manifestação previsíveis e
valorizadas pela sociedade. Em síntese, uma prática reducionista pelo viés
linguístico, e autoritária pelo significado político; uma metodologia
etnocêntrica que, pela desconsideração do aluno, mais se presta a alimentar o
quadro do fracasso escolar. O significado do aprender a ler Ao permitir que as
pessoas cultivem os hábitos de leitura e escrita e respondam aos apelos da
cultura grafocêntrica, podendo inserir-se criticamente na sociedade, a
aprendizagem da língua escrita deixa de ser uma questão estritamente pedagógica
para alçar-se à esfera política, evidentemente pelo que representa o
investimento na formação humana.
A história do ensino no Brasil, a despeito de
eventuais boas intenções e das “ilhas de excelência”, tem deixado rastros de um
índice sempre inaceitável de analfabetismo agravado pelo quadro nacional de
baixo letramento. O quadro da sociedade leitora no Brasil Do mesmo modo como
transformaram as concepções de língua escrita, redimensionaram as diretrizes
para a alfabetização e ampliaram a reflexão sobre o significado dessa
aprendizagem, os estudos sobre o letramento obrigam-nos a reconfigurar o quadro
da sociedade leitora no Brasil. Ao lado do índice nacional de 16.295.000
analfabetos no país (IBGE, 2003), importa considerar um contingente de
indivíduos que, embora formalmente alfabetizados, são incapazes de ler textos
longos, localizar ou relacionar suas informações. Os motivos pelos quais tantos
deixam de aprender a ler e a escrever Se descartássemos as explicações mais
simplistas que culpam o aluno pelo fracasso escolar; se admitíssemos que os
chamados “problemas de aprendizagem” se explicam muito mais pelas relações
estabelecidas na dinâmica da vida estudantil; se o desafio do ensino pudesse
ser enfrentado a partir da necessidade de compreender o aluno para com ele
estabelecer uma relação dialógica, significativa e compromissada com a
construção do conhecimento; se as práticas pedagógicas pudessem transformar as
iniciativas meramente instrucionais em intervenções educativas; se tudo isso
ocorresse, talvez fosse possível compreender melhor o significado e a
verdadeira extensão da não aprendizagem e do quadro de analfabetismo no Brasil.
Do ponto de vista dos alunos, o repúdio à tarefa, à escola e muito
provavelmente à escrita foi uma reação contra a implícita proposta de fazer
parte de um mundo ao qual nem todos podem ter livre acesso: o mundo da
medicina, da possibilidade de ser acompanhado por um médico e da compra de
remédios. A desconsideração dos significados implícitos do processo de
alfabetização – o longo e difícil caminho que o sujeito pouco letrado tem a
percorrer, a reação dele em face da artificialidade das práticas pedagógicas e
a negação do mundo letrado – acaba por expulsar o aluno da escola, um destino
cruel, mas evitável se o professor souber instituir em classe uma interação
capaz de mediar as tensões, negociar significados e construir novos contextos
de inserção social. Perspectivas das pesquisas sobre letramento Embora o termo
letramento remeta a uma dimensão complexa e plural das práticas sociais de uso
da escrita, a apreensão de uma dada realidade, seja ela de um determinado grupo
social ou de um campo específico de conhecimento motivou a emergência de
inúmeros estudos a respeito de suas especificidades.
É por isso que, nos meios
educacionais e acadêmicos, vemos surgir a referência no plural “letramentos”.
Embora ainda não dicionarizado, o termo “letramento” foi usado pela 1ª vez por
Mary Kato, em 1986, na obra No mundo da escrita: uma perspectiva
psicolingüística (São Paulo, Ática). Dois anos depois, passa a representar um
referencial no discurso da educação, ao ser definido por Tfouni em Adultos não
alfabetizados: o avesso do avesso (São Paulo, Pontes) e retomado em publicações
posteriores. No embate conceitual, a evidência desse paralelismo, é possível
porque podemos ter casos de pessoas letradas e não alfabetizadas (indivíduos
que, mesmo incapazes de ler e escrever, compreendem os papéis sociais da
escrita, distinguem gêneros ou reconhecem as diferenças entre a língua escrita
e a oralidade) ou pessoas alfabetizadas e pouco letradas (aqueles que, mesmo
dominando o sistema da escrita, pouco vislumbram suas possibilidades de uso).
Em uma sociedade como a nossa, o mais comum é que a alfabetização seja
desencadeada por eventos de letramento, tais como ouvir histórias, observar
cartazes, conviver com práticas de troca de correspondência, etc. No entanto, é
possível que indivíduos com baixo nível de letramento (não raro membros de
comunidades analfabetas ou provenientes de meios com reduzidas práticas de
leitura e escrita) só tenham a oportunidade de vivenciar tais eventos na
ocasião de ingresso na escola, com o início do processo formal de
alfabetização.
Métodos Sintéticos: da soletração à consciência fonológica
Juntando as letras: soletração A Carta do ABC (sem indicação de autor ou data):
o livrinho apresenta primeiro os alfabetos de letras maiúsculas e minúsculas de
imprensa e de letras cursivas. A ideia é ensinar os três tipos mais comuns de
sílabas existentes em português, como consoante-vogal (ba, na, ma
),vogal-consoante (al, ar, na ), consoante-consoante-vogal (fla, bla, tra ). O
objetivo maior da soletração é ensinar a combinatória de letras e sons,
partindo de unidades simples, as letras, o professor tenta mostrar que essas,
quando se juntam, representam sons, as sílabas, que por sua vez formam
palavras. O método baseia-se na associação de estímulos visuais e auditivos,
valendo-se apenas da memorização como recurso didático – o nome da letra é
associado à forma visual, as sílabas são aprendidas de cor, e com elas se
formam palavras isoladas fora do contexto. Quanto daria por um daqueles duros
bancos onde me sentava, nas mãos a Carta do ABC, a cartilha de soletrar,
separar vogais e consoantes. Repassar folha por folha, gaguejando as lições num
aprendizado demorado e tardio. Afinal vencer e mudar de livro. Excerto do poema
Voltei de Cora Coralina (2001), poeta goiana, nascida em 1889. Ba-be-bi-bo-bu:
silabação O método tem os mesmos defeitos da soletração: ênfase excessiva nos
mecanismos de codificação e decodificação, apelo excessivo à memória e não à
compreensão, pouca capacidade de motivar os alunos para a leitura e a escrita.
Cartilha da Infância (Thomaz Galhardo, 1979): depois de mostrar as vogais e os
ditongos, apresenta as sílabas va-ve-vi-vo-vu, embaralhando-as nas duas linhas
seguintes. Seguem-se palavras formadas de três letras (vai-viu-vou) e
finalmente onze vocábulos contendo as sílabas estudadas; cada lição se completa
com algumas frases sem ligação entre si, escritas sem a maiúscula na palavra
inicial e sem pontuação: “vovó viu a ave”, “a ave vive e voa”, “vovô vê o ovo”
e outras do gênero. A ordem de apresentação: primeiro, as cinco letras que
representam as vogais, depois os ditongos, em seguida as sílabas formadas com
as letras v, p, b, f, d, t, l, j, m, n. As chamadas “dificuldades ortográficas”
aparecem do meio para o fim da cartilha, incluindo os dígrafos, as sílabas
travadas (terminadas por consoantes), as letras g, c, z, s, e x. Métodos
fônicos Ensina-se o aluno a produzir oralmente os sons representados pelas
letras e a uni-los para formar as palavras. Parte-se de palavras curtas,
formadas por apenas dois sons representados por duas letras, para depois
estudar de três letras ou mais. A ênfase é ensinar a decodificar os sons da
língua, na leitura, e a codificá-la, na escrita. Atualmente, os métodos fônicos
tendem a apresentar pequenas frases, a partir da 2ª ou 3ª folha, para que os
alunos desenvolvam gradativamente habilidades de leitura mais complexas. Este
recurso visa a habituar o aluno a extrair o conteúdo significativo da palavra
lida e superar uma deficiência ainda comum no método (Rizzo apud Carvalho,
2005: 25). Método da Abelhinha (Alzira S. Brasil, Lúcia Marques Pinheiro e
Risoleta Ferreira Cardoso criaram o método em 1965): apresenta o método misto
do tipo fonético. Os sons são apresentados como "barulhos" que
ocorrem, o mesmo acontecendo com a reunião de dois sons em sílabas. Da reunião
de dois sons, a criança passa a três, e vai lendo palavras cada vez mais
extensas; depois expressões, sentenças e historinhas. Duas recomendações das
autoras: não dizer o nome das letras, pois seria cair na soletração; e não
fazer a união de fonemas com todas as vogais, pois seria a silabação,
prejudicando a leitura mais tarde. A personagem abelhinha, que dá nome ao
método, tem o corpo em forma de um a (em letra cursiva) e apresenta o som
/aaaaaaa/ (a vogal é prolongada para facilitar o reconhecimento); a letra i é
representada pelo tronco de um índio, outro personagem de histórias e assim por
diante. Os personagens são desenhados para sugerir o todo ou partes das formas
estilizadas das letras. Há portanto uma associação de três elementos –
personagem – forma da letra – som da letra (fonema). A alfabetização se faz por
síntese ou fusão dos sons para formar a palavra. A Casinha Feliz (criado pela
pedagoga Iracema Meireles na década de 1950): acredita na aprendizagem por meio
do jogo, propondo que a sala de aula fosse um espaço para a criatividade e a
livre expressão das crianças. Método: associar a forma da letra a um
personagem, o qual, por sua vez, representava determinado som. O essencial é
que conduza à figura-fonema capaz de fazer sempre, se for consoante, o
imprescindível barulhinho. Tudo mais é jogo, é dramatização, atividade
criadora. Cuidados a considerar na aplicação dos métodos fônicos Os dois
métodos apresentados propõem associações visuais e auditivas com a forma e os
sons das letras e têm o mérito de recomendar a utilização e recursos
expressivos de voz, gesticulação, desenho, teatro, etc. para despertar o
interesse infantil. Ambos giram em torno de histórias contadas oralmente e o
material escrito é rigorosamente controlado para apresentar apenas as palavras
cuja decodificação já foi, ou está sendo, ensinada. Um aspecto discutível dos
métodos é que as histórias dos manuais, criadas com o objetivo de apresentar as
relações letra-som numa determinada seqüência, são muito artificiais. É preciso
professores experientes, com bons recursos narrativos, para dar vida a
histórias didáticas, em que os sons ora são associados à forma das letras, ora
aos nomes dos personagens, ora a um “barulhinho” produzido por eles. Na
aplicação dos métodos fônicos, a maior dificuldade técnica é tentar articular
os sons das consoantes isoladas, pois de fato elas só ganham sons quando estão
acompanhadas de uma vogal. Existem algumas consoantes, como o /f/ e o /v/, que
podem ser prolongadas com certa facilidade, dando a impressão que se fundem com
as vogais que as acompanham. Mas não é o caso da maioria das outras que só são
ouvidas claramente quando acompanhadas das vogais. Consciência fonológica: é a
capacidade de distinguir e manipular os sons constitutivos da língua e consiste
na capacidade para focalizar os sons da fala, independentemente do sentido. Para
reconhecer o grau de consciência fonológica da criança, alguns indicadores são
a habilidade de identificar o número de sílabas das palavras e de reconhecer
rimas e aliterações (sílabas que se repetem no início de uma série de
palavras). Cada palavra falada é formada por uma série de fonemas,
representados na escrita pelas letras do alfabeto e a percepção destes é
desenvolvida no processo de alfabetização. As cartilhas e a alfabetização
Métodos globais: aprender a ler a partir de histórias ou orações Conhecer e
respeitar as necessidades e interesses da criança; partir da realidade do aluno
e estabelecer relações entre a escola e a vida social são diretrizes do
pensamento escolanovista. Métodos ativos – aprender fazendo –, liberdade para
criar e participação da criança no planejamento do ensino são algumas das
estratégias recomendadas.
A Escola Nova valorizava a leitura, as bibliotecas, o
gosto pelos livros, e trouxe uma inovação importante para os alfabetizadores: a
defesa dos métodos globais com a fundamentação teórica da crença segundo a qual
a criança tem uma visão sincrética (ou globalizada) da realidade, ou seja,
tende a perceber o todo, o conjunto, antes de captar os detalhes. Decroly
(1929) enfatizava a compreensão do significado desde a etapa inicial da
alfabetização e não a capacidade de decodificar ou de dizer o texto em voz
alta. A alfabetização deveria começar por unidades amplas, como histórias ou
frases, para chegar em nível de letra e de som, mas sem perder de vista o texto
original e seu significado.
Método de contos Um dos métodos mais antigos – o de
contos – começou a ser aplicado nos Estados Unidos no fim do século XIX.
Consiste em iniciar o ensino da leitura a partir de pequenas histórias,
adaptadas ou especialmente criadas pelo professor. Apresentada a história
completa, o texto é desmembrado em frases ou orações, que a criança aprende a
reconhecer globalmente e a repetir, numa espécie de pré-leitura. A seguir, vem
a etapa de reconhecimento das palavras. Depois disso é que se alcança a etapa
de divisão das palavras em sílabas e finalmente a composição de novas palavras
com as sílabas estudadas. O processo envolve análise das partes maiores (o
texto, as frases) para chegar às partes menores (palavras, sílabas), por isso o
método global é também chamado analítico. A professora Lúcia Casasanta (apud
Carvalho, 2005) assim descreveu as etapas do método:
1) fase do conto; 2) fase
da sentenciação; 3) fase das porções de sentido; 4) fase da palavração; 5) fase
da silabação ou dos elementos fônicos. O método não previa a utilização de
livro didático, o que constituía uma dificuldade para os professores, que
deviam criar textos e preparar materiais didáticos. Método ideovisual de
Decroly Um dos mais conhecidos métodos globais, o ideovisual, foi criado no
início do século XX por Ovide Decroly (1871-1932). As bases de sua filosofia de
educação eram: respeito à personalidade da criança, a seus interesses, a seu
ritmo natural e modos peculiares de ver o mundo. Pregava a importância da
atividade, da ação e da cooperação. Decroly propôs que o ensino se
desenvolvesse por centros de interesse e, em princípio, o programa escolar deveria
incluir conhecimentos imediatamente ligados à criança: suas necessidades
básicas no meio em que vive.
Experimentou um método de aprendizagem de leitura
que punha em jogo o que chamava “função de globalização”. Função que explicava
a capacidade da criança de captar as formas globalmente, justificaria começar a
aprendizagem por frases (unidades de sentido) em lugar de letras (elementos
gráficos isolados sem significação). Seu método: o aluno reconhecia a forma, o
desenho total, a imagem gráfica da frase. Em seguida, aprendia a distinguir as
palavras, por meio da observação de semelhanças e diferenças entre elas; em
seguida as sílabas, depois as letras. Método Natural Freinet Célestin Freinet
(1896-1966) acreditava que a inteligência, o gesto, a sensibilidade
desenvolvem-se através da livre expressão, do trabalho manual, da
experimentação. Sua pedagogia consiste em estimular a reflexão, a criatividade,
o trabalho, a cooperação e a solidariedade.
Seu Método Natural de aprendizagem
da língua parte do pressuposto que: a criança lerá e escreverá com interesse
textos relacionados com suas experiências. Dessa forma, seu método natural não
comporta fases ou etapas, como acontece com outras propostas, a criança aprende
a ler lendo, a escrever, escrevendo. Para ele a escrita e a leitura têm um
significado social, existem para servir ao homem em suas lutas, no seu
trabalho, na expressão de suas ideias. Em lugar de atividades puramente
formais, propunha que os alunos, desde tenra idade, escrevessem e lessem para
ser compreendidos e para entrar em relação com os outros. A metodologia de base
linguística ou psicolinguística A chamada Metodologia de base lingüística
propõe ensinar a ler a partir de orações. Foi elaborado na década de 1970 por
um grupo de professores coordenado pela professora Helena Gryner.
As premissas
do método são: respeitar a fase de desenvolvimento cognitivo e afetivo em que a
criança se encontra e tornar o aluno sujeito do processo, cabendo sempre a ele
a iniciativa e a descoberta. O processo de alfabetização deve começar pela
produção e reconhecimento de frases sugeridas pelas próprias crianças. Para dar
início à alfabetização propriamente dita, a professora escolhe uma ou duas
orações produzidas pelas crianças, que devem conter palavras cuidadosamente
escolhidas para atender a três critérios: 1) Critério de dificuldade: começar
pelo mais fácil em matéria de relações letra-som e de padrões silábicos. As
primeiras palavras-chave apresentadas devem ser formadas de fonemas como /b/,
/p/, /d/, /v/ e /f/, representados pelas letras b, p, d, v e f , que têm o
mesmo som, independentemente da posição na palavra. São os casos em que há uma
relação biunívoca entre os fonemas e os grafemas. Quanto ao tipo de sílaba, o
mais fácil é o mais comum, ou seja, consoantevogal (como em pa, da, va, etc.);
padrões silábicos mais complexos virão pouco a pouco. 2) Critério de
alternância entre o fácil e o difícil: o método recomenda que não se deixe para
a etapa final do processo de alfabetização as chamadas dificuldades ortográficas.
As letras que podem representar mais um som, conforme o contexto – como s, m,
l, x e outras – devem ser alternadas com aquelas consideradas mais fáceis. 3)
Critério de produtividade: selecionar palavras-chave que depois de desmembradas
em sílabas permitam formar um bom número de palavras novas. Alfabetização a
partir de palavras-chave O método da palavração propõe o ensino das primeiras
letras a partir de palavras-chave, destacadas de uma frase ou texto mais
extenso. As palavras destacadas são desmembradas em sílabas, as quais,
recombinadas entre si, formam novos vocábulos. Método Natural de Heloísa
Marinho Apóia-se em Jonh Dewey, Decroly e outros escolanovistas que ressaltam a
importância da atividade da criança no processo de ensino-aprendizagem. Os
passos de aplicação são os seguintes: 1) A professora usa abundantemente a
escrita. Registra, à vista dos alunos, fatos ocorridos na sala de aula, ou algo
dito pelas crianças. Escreve bilhetes, convites, avisos destinados aos pais. 2)
Estimula a percepção dos sons iniciais e finais de palavras ditas oralmente,
utilizando técnicas e materiais que permitam descobrir semelhanças e diferenças
entre sons, através da comparação. 3) Forma um vocabulário básico de 35 a 40
palavras (apenas substantivos e verbos) que a criança deve aprender a
reconhecer globalmente, em sentenças e pequenos textos, qualquer que seja sua
posição nos textos. 4) Leva a criança a descobrir o som dentro da palavra e a
associar o som à letra.
5) Estimula a criança a ler e a escrever palavras novas
com compreensão e rapidez, incentiva a leitura como fonte de informação e de
prazer, e a escrita como instrumento de registro de ideias e de comunicação.
Método Paulo Freire A metodologia proposta por Paulo Freire também se
classifica como palavração, com a importante diferença de que as palavras
geradoras (palavras-chave) apresentadas aos adultos analfabetos são pesquisadas
no universo vocabular deles próprios. Os procedimentos técnicos do método são:
1) Ao planejar um trabalho de alfabetização em determinada área, deve-se fazer
um levantamento do universo vocabular da população, selecionando um grupo de 17
a 20 palavras de uso frequente, relevantes para a população e que apresentam as
combinações básicas dos fonemas e padrões silábicos. São estas as palavras
geradoras, que constituirão pontos de partida dos debates entre os
participantes dos círculos de cultura. 2) Para dar início à alfabetização, o
coordenador do círculo de cultura deve apresentar algumas imagens (em slides ou
cartazes) que propiciem o debate sobre as noções de cultura e de trabalho.
Estas imagens representam o produto do trabalho dos homens sobre a matéria da
natureza: suas ferramentas, utensílios de uso diário, suas moradias. O objetivo
é fazer com que os alunos reconheçam a si próprios como criadores de cultura.
3) Para ensinar as relações entre letras e sons, o ponto de partida é a palavra
geradora, que é decomposta em sílabas. Em seguida, apresentase a ficha
descoberta, em que aparecem as famílias silábicas correspondentes. Para a
professora, seja qual for o método escolhido, o conhecimento das suas bases
teóricas é condição essencial, importantíssima, mas não suficiente.
A boa
aplicação técnica de um método exige prática, tempo e atenção para observar as
reações das crianças, registrar os resultados, ver o que acontece no dia-a-dia
e procurar solução para os problemas dos alunos que não acompanham. Além de
conhecer o método em si, é preciso que o professor se pergunte: • O que
realmente tenho em vista ao ensinar a ler? O que estou buscando? Que usos da
leitura e da escrita pretendo que o aluno venha a praticar? De que materiais
disponho ou estou disposto a criar? Como as crianças se relacionam com a
escrita, o que sabem sobre o assunto? Como eu próprio me relaciono com a
leitura, a escrita e o método? Produção de Texto - Produção e Correção Produzir
é realizar, criar, fabricar; texto é um desenho, uma palavra, uma frase ou um
conjunto delas que, dentro de um contexto, transmite um significado ou uma
idéia. Produzir textos é inerente à criança. Antes mesmo de conhecer letras,
ela conta um fato, descreve um passeio, dita regras de uma brincadeira, entre
outras coisas. Em sua rotina diária, ela produz texto oral. Seu mundo é um
emaranhado de palavras que aqueles que a cercam conseguem entender apenas
porque “ela se faz entender”. Existe um diálogo natural que se manifesta, por
exemplo, quando a mãe, por não entender o que a criança diz, pede que ela
repita ou mostre, tendo em vista auxiliar o filho. Entretanto, na escola, a criança
precisa obedecer a regras de espaço, seqüência e lógica, aliadas às regras
ortográficas e gramaticais não definidas para ela. Algumas vezes, o aluno não
escreve porque não sabe o quê ou sobre o quê quer escrever, ou porque não está
motivado, independentemente de saber escrever ou não; outras vezes, ele escreve
apenas para satisfazer uma exigência do professor. Assim, a criança se nega a
produzir ou não se esforça muito para isso. E, então, começa o bloqueio:
escreve pouco ou não escreve.
A criança passa por fases na produção, todas
igualmente importantes para ela, e o professor deve requerer essas produções de
maneira gradativa no que se refere à dificuldade de execução, ou seja, para
chegar a elaborar um texto individualmente, com forma e conteúdo próprios, a
criança precisa, antes, trabalhar textos coletivamente ou em pequenos grupos,
sob a orientação do professor, com base em modelos de escrita corretos e
variados quanto à forma (poesia, contos, música, trava-língua, etc.). Sem
dúvida, é muito mais gratificante ler um texto que se desenvolve dentro dos
padrões convencionais da ortografia, mas isso não deve ser a primeira e a
principal preocupação, porque a escrita considerada correta, nos padrões da
norma culta, não está pautada na oralidade, e apenas com o “exercício” o aluno
poderá perceber isso e se corrigir. A criança precisa ser incentivada a
soltar-se para escrever, a revelar seu interior, a transcrever suas
experiências, a relatar fatos do seu mundo sem ter que se preocupar com
correções, riscos vermelhos e notas baixas: simplesmente escrever o que lhe dá
maior prazer e saber que, com isso, está se comunicando. Seja qual for a reação
do professor ao ler um texto, o importante é que ele tente “traduzir” o que o
aluno quis transmitir. Se não conseguir entender, o professor deve pedir que a
criança faça a “leitura”. Atualmente, existe uma preocupação maior com a
produção de textos desde os primeiros anos de escolaridade e, depois de
observar nossos alunos, podemos concluir que a criança pode escrever um texto
desde o primeiro dia de aula. Em geral, não é muito fácil o entendimento desses
textos iniciais por parte do professor, e para que isso não aconteça, para que
o aluno tenha retorno do seu trabalho, é preciso conversar com a criança sobre
o que ela escreveu.
Não é preciso fechar famílias silábicas nem desenvolver
regras gramaticais antes da produção. A criança deve escrever da maneira como
entende que seja a escrita e, aos poucos, ao ser desenvolvidos os conteúdos,
ela mesma se corrigirá ou, se um determinado erro persistir, deverá ser
direcionado à correção. Os alunos se interessam mais por uma informação e a
retêm melhor se ela fizer parte de um todo: eles vivem o momento tão
intensamente que tudo o que é retirado de um assunto central, com significado
para eles, fará parte deste momento tão bem vivenciado. Portanto, não têm
sentido atividades como trabalhar com listas infindáveis de palavras com mesma
dificuldade gramatical, trabalhar páginas inteiras de treinos ortográficos,
separar sílabas de dezenas de palavras com dígrafos e fazer cópias
quilométricas.
Uma atividade muito longa e repetitiva cansa, desanima,
desestimula e desinteressa. Palavras soltas, sem significado e sem adequação
imediata perdem-se no espaço do papel, desaparecem sob a vista com a mesma
rapidez com que foram escritas. É comum ouvir de professores que certo aluno,
depois de tanto treino e exercício, ainda escreveu errado determinada palavra.
Treinou como? Para quê? Todo e qualquer conteúdo sobre questões gramaticais deve
ser extraído de um contexto, de um assunto de interesse comum para que se torne
significativo, interessante e objetivo, e o aluno tem, no mínimo, os oito anos
do Nível I para entender essas questões de maneira ampla. Tratando-se de
produção de texto, o mecanismo é mais ou menos o mesmo. Diante da proposta do
professor é imprescindível que o aluno entenda os objetivos e queira participar
da atividade. Ele se coloca perguntas do tipo: O que escrever? Como? Para quê?
Para quem? Vários assuntos que podem dar margem à produção aparecem,
simplesmente, na rotina diária: um aluno que se machucou, um dente de leite que
caiu, alguém que fez uma visita à classe, uma excursão ou um passeio que os
alunos fizeram no fim de semana, um capítulo de novela que alguém assistiu,
etc. Mas, apesar da variedade dos temas, às vezes estes não se aproximam da
expectativa do professor e os alunos não atingem o objetivo específico que ele
queria atingir. Nessas ocasiões, as crianças precisam de um estímulo,
envolvendoas de tal maneira que o registro, a produção escrita e/ ou a
manifestação gráfica sobre determinado assunto da expectativa do professor
sejam considerados importantes, cabendo ao professor direcionar a expressão
oral. Com jogos, músicas, adivinhações, brincadeiras de roda, trabalhos
artísticos, história, parlendas, poesias, etc. o professor pode, e na maioria
das vezes consegue, levar as crianças à escolha do tema. Sugestões para
produção A produção de texto não deve ser trabalhada isoladamente; pelo
contrário, devemse aproveitar o assunto, o tema ou a palavra que estão sendo
trabalhados para intercalar a produção. Sob esse ponto de vista, a produção de
texto é apenas mais uma atividade a ser executada pelos alunos. A seguir,
algumas idéias de atividades de produção de texto para ser desenvolvidas com os
alunos. Como todas as outras sugestões, essas também não são rígidas: fica a
critério do professor adaptá-las, de acordo com o nível em que se encontram os
alunos. Sugerimos, também, que as produções sejam arquivadas em um caderno
específico, de maneira que o progresso do aluno possa ser percebido e avaliado
com maior segurança pelo professor. • Escrever seu nome e desenhar você mesmo.
• Desenhar o pai ou a mãe e escrever “meu Pai” ou “minha Mãe”, de acordo com o
desenho. • Desenhar sua casa, sua família e escrever os nomes. • Desenhar seus
amigos e escrever seus nomes. • Desenhar seus brinquedos e escrever seus nomes.
• Escrever a respeito do brinquedo ou da brincadeira de que mais gosta. •
Escrever sobre seu animal preferido e depois fazer o desenho. • Fazer o desenho
de um animal de que tem medo e escrever sobre ele. • Desenhar sua classe e seus
colegas e escrever sobre eles. • Fazer um desenho com base numa história
contada e copiar o título. • Depois de ouvir uma história, fazer o desenho e
escrever o que quiser sobre ela. • Escrever o que quiser sobre uma data
comemorativa. • Montar personagens com material de sucata e, em grupo, produzir
uma história oral. Desenhar os personagens utilizando sucata e transcrever a
história. • Fazer uma história tomando por base um Banco de Palavras. A classe
decide sobre o que vai escrever e sugere as palavras que entrarão na história;
o professor escreveas num papel manilha ou na lousa para que as crianças possam
recorrer a elas durante a produção. • Recortar letras de jornais e revistas;
montar seu nome e escrever uma frase ou texto. • Recortar letras e formar
palavras. Em seguida, fazer um desenho e escrever uma frase ou um texto que se
refira à palavra formada. • Escrever sobre um fato da atualidade (ecológico,
social, político, policial, etc.). O professor pode aproveitar uma notícia de
jornal ou uma pergunta de um aluno para propor o tema. • Depois de assistir a
um filme em vídeo, escrever a história. • Escrever sobre “o que gostaria de ser
quando crescer” e desenhar. • Escolher uma figura, recortar e colar em uma
folha. Em seguida, escrever sobre ela. • Fazer uma montagem e escrever sobre
ela. • Escrever sobre uma figura: o professor recorta uma parte de uma figura
de objeto, animal, alimento ou brinquedo e cola em folha de linguagem. O aluno
deve identificar a figura (distinção parte/todo) e escrever sobre a parte ou
sobre o todo. • Escrever sobre um assunto de Ciências e Saúde e montar um
livrinho. O professor promove e coordena uma discussão sobre o tema. Em
seguida, as crianças fazem um texto coletivo e o transcrevem para o livro, onde
fazem as ilustrações. Ao terminar, cada criança terá o seu livro. • Fazer um
livro sobre o arco-íris: cada folha terá uma cor pintada ou um recorte colorido
de tecido, papel, plástico, etc. O aluno escreve o nome da cor e o que ela
significa para ele. • Fazer o Jornal da Classe. Cada aluno faz um trabalho que
pode ser produção, cruzadinha, adivinhações, receita, desenho para ser pintado,
desenho para ligar os pontos, etc. Sob a orientação do professor, eles
selecionam os trabalhos e montam o jornalzinho. Cada aluno transcreve seu
trabalho para a folha de estêncil e assina. O professor também pode contribuir
com alguma atividade. Com o tempo, o jornal poderá ser feito em nível de ano,
período ou escola. • Escrever um livro. O professor dobra as folhas de papel
sulfite no meio, formando o livro e grampeia.
Cada aluno escreve uma história e
transcreve cada frase em uma página, faz os desenhos, elabora a capa, escreve o
título e assina. • Fazer um desenho com bolinhas de papel de seda e escrever
sobre ele. • Contar um sonho que teve e escrever sobre ele. • Escrever sobre
uma experiência vivenciada. Por exemplo, um passeio à feira, ao zoológico, etc.
• Escrever sobre um animal que foi trazido para a classe. Um aluno, ou alguém
da escola, traz, escondido, um animal (ou foto dele) e não diz qual é. As
crianças conversam com o dono para saber os hábitos, a alimentação, a
utilidade, etc. do bicho e, pelas características, tentam descobrir qual é o
animal. As informações são completadas pelo professor como conteúdo de Ciências
e saúde e, em seguida, as crianças fazem um Banco de Palavras. A produção de
texto é o principal elemento de avaliação do professor. Quando o aluno consegue
se comunicar dentro dos padrões da escrita, fica fácil para o professor fazer
uma avaliação, mas quando só o aluno “sabe” o que escreveu ou o que “pensa” que
escreveu, o professor precisa procurar entender o texto, pedindo que o aluno faça
a leitura, apontando para a escrita. De acordo com a relação que o aluno fizer
entre a leitura e a escrita na hora do relato, o professor conseguirá avaliar,
primeiro, a hipótese em que o aluno se encontra em relação à aprendizagem e,
depois, a produção quanto à criatividade, à seqüência lógica dos fatos, à
coerência, à conclusão da história e aos conceitos referentes à ortografia. É
neste momento, também, que o professor sentirá se o aluno está bloqueado, ou
não, para escrever.
A correção da produção não deve inibir a criação, mas deve,
sim, ser feita de maneira gradativa para que o aluno tenha tempo de elaborar
novas hipóteses para os eventuais “erros” e continue escrevendo. Por isso, a
correção deve ser coerente com a etapa do processo em que o aluno se encontra e
o professor deve procurar respeitar essa etapa, adequando sua correção. Não faz
sentido, por exemplo, fixar-se em erros ortográficos se os alunos ainda estão
passando pela hipótese silábica. Quando o aluno não consegue estabelecer uma
seqüência lógica na escrita, quando não expressa suas idéias com coerência e
clareza, é preciso que o professor trabalhe no sentido de desenvolver tais
capacidades. A expressão das idéias é muito importante para o desenvolvimento
integral da criança e deve anteceder à preocupação com a escrita correta das
palavras.
No que se refere aos elementos a ser corrigidos, devemse levar em
consideração duas questões distintas: a da macroestrutura e a da
microestrutura. A primeira envolve a coerência no sentido do texto e a segunda
trata da coesão na forma, na estrutura “física”. Portanto, o trabalho com a macro
deve anteceder aquele com a microestrutura. Os erros constantes demonstram a
“lógica” com que a criança está lidando naquele momento e são indicadores do
campo de ação do professor. Enquanto ela não superar ou adequar sua hipótese,
não adianta insistir na correção repetitiva, que acabará criando dúvidas (uma
vez que ela não compreende, ainda, a explicação), e conseqüentemente uma
atitude retraída diante do texto. Cada hipótese dos níveis de aprendizagem
apresenta uma pequena série de errospadrão que são resolvidos quando a criança
se coloca novas possibilidades. Por exemplo: muitas palavras sofrem, além da
influência regional, “vícios” da fala que a criança procura transcrever com
exatidão, como falá (falar), bolu (bolo), pexi (peixe), papéu (papel), etc., e
tais “erros” só serão sanados quando a criança puder diferenciar a língua
escrita da oral. Outro exemplo: quando a criança, ao escrever, emenda palavras
ou separa letras de uma mesma palavra, ela demonstra ter compreendido que a
escrita é a representação da fala e, do mesmo modo que não separamos todas as
palavras quando falamos, ela procura representar a segmentação tal qual ela
acontece na fala, transferindo isso para a escrita. Com o tempo, a própria
criança sente que precisa escrever de maneira que todos entendam (de acordo com
a norma culta-padrão) e, neste momento, ela intensifica a compreensão de que a
escrita tem um valor social muito importante: a comunicação. A partir do
momento em que o aluno se torna alfabético, é oportuno fazer um trabalho
ortográfico e sintático. Sabemos muito bem que as regras de ortografia são
muitas e não é fácil para a criança assimilá-las: até mesmo nós, adultos
ortográficos, sentimos a necessidade de recorrer ao dicionários em várias
ocasiões. Sabemos também que as palavras com as quais a criança tem maior
aproximação, ou mais familiaridade, são assimiladas com mais facilidade.
Sugestões para efetuar a correção Para trabalhar a macroestrutura, o professor
pode desenvolver atividades que envolvam sequência e ordenação de objetos,
fatos e números. Esse trabalho envolve a organização do dia-a-dia, das
atividades e também a organização do raciocínio lógico. No momento da correção
sistematizada, o professor pode trabalhar tanto com o aluno individualmente,
quanto com a classe, isto é, pode trabalhar cada produção com seu “escritor” ou
trabalhar, com a classe toda, uma produção escolhida pelas crianças. Corrigir
um texto sozinho é tarefa muito difícil para o aluno, e até ele chegar a
melhorar conscientemente um texto, deve ser feito um trabalho oral. Para chegar
à autocorreção, o professor precisa trabalhar primeiro com a classe, depois com
grupos menores e, finalmente, com cada aluno individualmente, para que, relendo
seu texto, a criança possa fazer uma autocrítica consciente de seu trabalho,
ter conhecimento da expectativa do professor e conseguir a autocorreção. Para
corrigir erros ortográficos numa produção o professor pode optar por circular
palavras erradas e listá-las corretamente no final; fazer uma marca na margem da
linha em que houver erro para que o aluno o descubra; listar na lousa as
palavras que aparecem erradas muitas vezes e pedir que os alunos as registrem
em ordem alfabética; incentivar e facilitar o uso do dicionário; e, sempre,
requerer que o aluno leia o texto e faça a correção. Além disso, pode reunir os
alunos em pequenos grupos e levá-los a descobrir qual seria a maneira certa de
escrever as palavras erradas, anteriormente sublinhadas. A sistematização das
regras deve ser desenvolvida com base no texto produzido, e não o contrário,
isto é, pedir produção de texto baseada em regras pré-concebidas. Outra técnica
de correção que pode ser usada com alunos alfabéticos é a reescrita. O
professor pode trabalhar a correção de um texto na lousa, em cartolina, em
papel manilha, ou mesmo numa folha de linguagem, se a correção for individual;
se for coletiva, o texto deve ser fixado na metade da lousa.
O “escritor” do
texto interage com seus colegas e com o professor, trocando experiências e
ponderando hipóteses até chegar a conclusões mais “corretas”, sem que, com
isso, precise mudar a ideia original. As dificuldades variam de criança para
criança e é com base nessas diferenças que a interação acontece: a dúvida de um
aluno pode ser a certeza de outro. Normalmente, a classe estabelece com este
aluno, o autor, uma relação positiva e enriquecedora: a socialização do saber.
O professor deve ser o desafiante e o mediador quando as discussões se perdem
ou quando o assunto foge do conceito das crianças, equilibrando a participação
e orientando as correções já discutidas. Aos poucos, na outra metade da lousa,
o texto vai sendo reescrito pelo professor ou por um aluno.
O objetivo da
reescrita é fazer o aluno perceber que conseguiu se comunicar; que, se
necessário, seu texto pode ser escrito de outra maneira a fim de que outras
pessoas o entendam melhor; e que pode ter um modelo corrigido de sua criação,
sem a necessidade de ver seu original rabiscado. A constância desse trabalho
ajuda a despertar autocrítica da criança na hora de escrever. Enfim, é muito
importante que a criança não se iniba ao escrever, transcreva suas ideias,
ponha em conflito suas hipóteses, sinta-se respeitada na maneira como se
comunica e seja corrigida quando necessário. Ela precisa chegar a escrever ortograficamente
de maneira satisfatória, mas não será nos primeiros anos de escolaridade que
ela atingirá este nível. Precisamos dar-lhe tempo e proporcionar condições para
que o aperfeiçoamento ocorra.
A
ortografia é uma parte da gramática que apresenta aspectos regrados (M
antes de P e B, por exemplo) e não-regrados (palavras escritas com S, Z, CH,
X). Os regrados podem ser reconstruídos pelo aluno, porque fazem parte de um
conhecimento lógico matemático; já os não-regrados se referem a um conhecimento
social-arbitrário formando a imagem mental da palavra, ou seja, constituindo o
repertório das palavras mais utilizadas e tendo consciência de como são
escritas, independentemente da maneira como são faladas.
Compreendendo a
questão da imagem mental, é possível entender por que a maioria das crianças
passa anos fazendo cópias e ditados e ainda assim escreve “errado”.
Autocorreção é um procedimento de transformação da “imagem mental” que as
crianças têm das palavras no que se refere à ortografia. Consiste na comparação
da palavra escrita incorretamente pelo aluno com a forma ortograficamente
correta, na observação dos contrastes e na correção do que estiver diferente.
Uma forma de preparar a autocorreção é sublinhar e/ ou numerar as palavras que
necessitam de correção e escrevê-las no final da página.
Em seguida, devolver o
texto à criança para que ela faça a comparação, o contraste e a correção. Em
turmas mais adiantadas, podem-se assinalar as palavras e pedir que o aluno
procure no dicionário. Junto com os alunos, o professor estabelece um código
para ser usado durante a leitura avaliatória. Assim, em vez de “corrigir” o
texto, o professor apenas indica, com esse código, os locais em que o aluno
fará a autocorreção. Vejamos alguns exemplos de códigos que podem ser adotados:
É interessante que, numa escola, todos os professores adotem o mesmo código em
todas as séries, a fim de facilitar o trabalho nos anos posteriores. A
aprendizagem da leitura Ler não deve se resumir a decifrar caracteres,
distinguir símbolos e sinais, unir letras e emitir sons correspondentes: isso é
muito mais um trabalho de discriminação visual e auditiva que antecede a
leitura propriamente dita. Ler, além de decifrar, é interpretar a mensagem,
atribuir a ela uma vivência pessoal e interiorizá-la. A leitura faz parte da
rotina diária da criança e ela não espera receber instruções de outra pessoa
para iniciá-la. Placas, letreiros, programas de TV, embalagens, marcas, títulos
e todos os objetos constantes no seu dia-a-dia transmitem uma significação
própria e se tornam tão familiares que sua leitura é espontânea, podendo
ocorrer muito antes da decifração dos códigos. Por exemplo, a maioria das
crianças lê a palavra Coca-Cola, decifrando, ou não, sua escrita. No entanto,
na escola, algumas crianças ficam bloqueadas para a leitura, principalmente
quando são apresentados textos pouco significativos para elas. A sala de aula
deve dar continuidade à leitura prazerosa, aquela que estimula a criança, que
aguça sua curiosidade, sensibilizando-a de alguma maneira. As crianças
demonstram ser leitores atentos, curiosos e observadores, desde que o material
a ser lido seja interessante e desafie sua inteligência. Bilhetes e comunicados
dirigidos aos pais devem ser lidos junto com as crianças, sempre que possível.
Material escrito, como livros de histórias, revistas, jornais, folhetos, gibis,
artigos, livros didáticos de diferentes anos escolares precisam estar presentes
na classe, não importando se a criança está “pronta” para lê-los.
Intuitivamente, ela escolhe o material escrito de acordo com suas necessidades
e opta por livros com maior ou menor número de desenhos, páginas e letras.
Muitas vezes, a criança escolhe um livro e troca-o logo em seguida sem ter
feito um bom uso dele porque, certamente, aquele material ainda não parecia ser
suficientemente interessante ou não era adequado ao seu “estágio” de leitor.
Ainda assim, o aluno precisa ter liberdade de escolher e de usar diferentes
modelos de escrita e isso deve ser feito de modo que ele não sinta, desde o
início, que a finalidade da leitura é a aquisição de habilidades de
decodificação. O professor precisa incentivar o gosto pela leitura porque ela é
a base da escrita, procurando desenvolver, no aluno, a leitura crítica, para
que possa questionar e opinar sobre o conteúdo implícito e explícito do texto.
A interpretação não deve se resumir a, simplesmente, completar frases
transcritas diretamente do texto ou a responder perguntas que, visivelmente,
possibilitam (ou direcionam para) uma única resposta, mas deve, sim, estar
baseada no que o texto transmite ao aluno enquanto indivíduo, para que, depois,
ele possa externar suas opiniões. Ao fazer a leitura, o professor precisa
respeitar as interferências do aluno e garantir que, de alguma forma, ele
“participe” do texto que está sendo lido. Leituras de letras de música,
receitas de culinária, contos de fada, regras de jogos, histórias vivenciadas
pela classe, manchetes de jornal, embalagens e avisos são elementos que
oferecem uma base interessante para se fazer, além da interpretação, as
atividades de gramática, ou mesmo quaisquer outros trabalhos ligados às
diferentes áreas de estudo. Discute-se o uso de textos literários, como se
fossem didáticos, em atividades ligadas ao exercício da língua.
No entanto, após
trabalhar a leitura de várias maneiras, não vimos nem percebemos qualquer
impedimento na utilização de qualquer texto, desde que seja agradável ao aluno,
em diferentes situações. Ao contrário, os resultados foram surpreendentes bons,
visto que, quando o texto não é do interesse do aluno, todo o trabalho fica
prejudicado, tanto em nível teórico quanto prático. Sugestões para leitura •
Leituras individual ou coletiva. • Leituras silenciosas ou em voz alta. • Ler o
que está fixado nas paredes: ler e interpretar o material que faz parte do
ambiente alfabetizador. • Ler textos que a criança tem na memória
(pseudoleitura). • Ler palavras ou frases que formam o Banco de Palavras. • Ler
textos produzidos pelos próprios alunos e fazer a interpretação oral ou escrita.
• Recortar de jornais e revistas somente as palavras ou frases que saiba ler e
fazer a leitura para o professor. • Ler um texto e reduzir (resumir) as
informações. • Ler frases fora de ordem e organizá-las, tornando o texto
coerente. • Com o professor, fazer a leitura dialogada: o professor lê um texto
e incentiva o diálogo, lançando perguntas e desafiando os alunos a sugerir uma
continuidade para a história. • Antecipar uma história com base no título e/ ou
na capa do livro. A escolha dos textos Que textos escolher para as crianças? No
momento de começar o ensino sistemático da leitura, o tema e os significados do
texto escolhido são decisivos. Para crianças de 6 anos, que estão iniciando o
processo de alfabetização, cheias de curiosidade e disposição para aprender,
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